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O céu é o limite?

por Mauricio Palma Nogueira
Sexta-feira, 15 de junho de 2007 -10h13
“O céu é o limite”! Essa foi a expressão usada por um dos pesquisadores da FIPE (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) ao se referir aos aumentos nos preços do leite nas últimas semanas. O leite e seus derivados, segundo a fundação, contribuíram com pouco mais de 40% da inflação em São Paulo, na primeira quadrissemana de junho (últimos 30 dias encerrados em 7 de junho).

A FIPE calcula o IPC (índice de preços ao consumidor), que mede a variação de preços para o consumidor que ganha de dois a seis salários mínimos, em São Paulo.

No cálculo do IGP-DI (índice geral de preços - disponibilidade interna), acompanhado pela Fundação Getúlio Vargas, o leite também aparece dentre as maiores influências positivas do mês, tanto nos preços por atacado (matéria-prima), como nos preços ao consumidor (leite longa vida).

É conclusivo que há forte influência do mercado de leite na inflação das últimas semanas.

Na última edição do informativo A Nata do Leite, que circulou no final de maio, o destaque foi o comportamento dos preços do leite longa vida e do leite no mercado “spot”, matéria-prima comercializada entre as indústrias.

De janeiro a maio, o preço do longa vida no atacado – que as indústrias recebem – subiu R$0,41/litro, alta de 36% no período. Até o início de junho, o varejo não havia conseguido repassar a mesma alta para o consumidor. Em média, o preço do longa vida havia aumentado 25%, ou R$0,33/litro no varejo.

As diferenças de preços entre varejo e indústria, que geralmente são de 14%, permaneceram por volta dos 4,65%, níveis próximos aos mais baixos registrados pela Scot Consultoria desde 2002, quando passou a acompanhar regularmente o mercado varejista.

Em média, o longa vida foi comercializado a R$1,65/litro nos supermercados. As marcas que atingiram as melhores cotações chegaram a R$1,71/litro, em média, com algumas sendo vendidas a R$1,87/litro.

Mesmo que os preços tenham subido muito, em pouco tempo, o preço atual ao consumidor ainda é cerca de 9% inferior ao que era pago entre 2000 e 2003, corrigindo os valores pelo IGP-DI. Quando se corrige pelo IPC, os preços atuais já são mais elevados.

Para ilustrar o processo, comparou-se a evolução dos preços de lácteos no varejo e os índices de inflação, no período de 2002 a 2007.

Tanto os preços de mercado, como os índices, foram transformados em equivalente 100 para o mês de janeiro de 2002. A partir daí toda a evolução dos preços foi considerada em relação ao índice 100 de janeiro de 2002.

Observe o comportamento na figura 1.



Pela figura pode se constatar que, em maio de 2007, a evolução do preço do leite longa vida no varejo igualou-se à do IGP-DI. No entanto, foi 18% acima da evolução do IPC, o que tem chamado atenção no mercado.

Outros produtos lácteos, como leite tipo B e os queijos, ainda não alcançaram o mesmo desempenho, quando comparados ao IPC. Mesmo assim, entre janeiro e maio, a alta nos preços foi mais significativa que a inflação.

É assim mesmo que acontece com o cálculo de índices de inflação. Ora um produto exerce influência positiva, ora exerce influência negativa. Tanto é que a curva do IPC, na figura 1, manteve o ritmo de aumento observado no período.

Parece ser a vez do leite pesar positivamente na inflação, pois mesmo com o longa vida subindo 25% no varejo, entre janeiro e maio, a inflação pelo IPC no período foi de 1,13%, com projeção ainda dentro da meta de inflação do ano. Os preços de outros itens que compõem o cálculo da inflação recuaram.

Ainda com base nos números levantados pela FIPE e pela Scot Consultoria, é possível estimar a evolução dos preços de todos os lácteos ao consumidor.

Considerando que o consumo anual de lácteos no Brasil seja de 138 litros de leite per capita, e que o leite fluído represente 50% do total, é possível estimar o impacto geral dos lácteos dentro dos orçamentos familiares.

Estimando ainda que apenas 10% do consumo de lácteos seja via mercado informal, e que o longa vida já tenha abocanhado 75% do mercado formal, pode-se considerar que o impacto dos preços do longa vida ao consumidor seja de 38,7% dentre o total dos produtos lácteos consumidos.

Se o comportamento dos demais fluídos acompanhou o do leite tipo B e os de outros derivados acompanharam os dos queijos prato e mussarela, a cadeia láctea, como um todo, teve seus preços valorizados em apenas 2,25% acima da inflação pelo IPC em maio, quando comparado a janeiro de 2002.

Em relação ao IGP-DI, a remuneração dos lácteos ainda estaria 18% abaixo do observado no período.

Evidentemente que o cálculo dos índices, realizado por institutos especializados, deve seguir critérios tecnicamente estabelecidos com alto rigor estatístico. Ainda assim, é possível comparar os índices com o comportamento geral do mercado, como realizado nesta análise.

E estes números, estimados para os produtos lácteos, não ficam muito fora de realidade.

Considerando que os preços ao produtor, de certa forma, acompanham o comportamento do mercado varejista, é possível comparar a evolução das cotações dos lácteos e dos índices IPC e IGP-DI, durante todo o Plano Real. Observe a figura 2.



Em maio de 2007, comparado com agosto de 1994, o preço do leite ao produtor paulista apresentou evolução 6,8% acima do IPC e 22% abaixo do IGP-DI. Vale ressaltar que enquanto a inflação mantém uma tendência de evolução homogênea ao longo dos anos, o preço do leite oscila constantemente, ora subindo mais que a inflação, ora subindo menos. É o mesmo raciocínio da comparação anterior.

Sendo assim, com relação aos índices de inflação, os preços dos lácteos atingiram patamares dentro da realidade econômica. Em termos macroeconômicos ainda não há nada de surpreendente nos preços praticados no mercado. O que ocorre é que toda a alta se concentrou em um curto período de tempo - os últimos cinco meses.

Comparado ao IGP-DI, inclusive, os lácteos ainda mantêm remuneração abaixo da inflação observada do período.

No entanto os preços não são regidos pelos índices; ocorre justamente o contrário. O mercado segue leis de oferta e demanda. Se o preço está bom, há aumento de produção o que provoca queda nos valores. Se o preço está ruim, a pressão é inversa.

E, nunca esquecendo, que a capacidade de resposta do produtor brasileiro a estímulo de preços é bem elevada, o que pode mudar rapidamente a balança entre oferta e demanda.

O céu pode até ser o limite, mas a que distância está do chão é a oferta de leite que definirá. Quando e quanto são as perguntas que ainda permanecem sem respostas.