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Produzir mais sem abrir novas áreas: o potencial da pecuária baseada em pasto

por Pedro Gonçalves
Sexta-Feira, 01 de Agosto de 2025 - 06h00

Pedro Gonçalves, engenheiro agrônomo e analista de mercado da Scot Consultoria, aborda em entrevista os desafios e oportunidades para ampliar a produção de carne bovina sem expandir a fronteira agrícola. Ele comenta sobre a importância da recuperação de pastagens degradadas, os impactos da volatilidade dos preços dos fertilizantes na intensificação e o papel central do manejo de pastagens na rentabilidade e sustentabilidade do setor. Pedro também adianta o que o público pode esperar de sua palestra no Encontro de Intensificação de Pastagens.

Scot Consultoria: Diante das projeções de aumento significativo da demanda global por alimentos nas próximas décadas, é possível suprir esse crescimento sem recorrer à expansão da fronteira agrícola sobre áreas naturais?

Pedro Gonçalves: Sim, sem dúvidas, somos capazes de aumentar a produção de alimentos sem a necessidade de expansão exagerada das áreas agrícolas. É claro que tem um limite, mas, considerando os indicadores de produtividade atuais, ainda há espaço para ampliar a produção sem aumentar a área utilizada.

Atualmente, no Brasil, estima-se que, em 2025, haverá aproximadamente 38,0 milhões de hectares de pastagens com degradação. Área que, tem um custo maior de recuperação, mas que pode ser trabalhada. Por isso, é necessária uma postura mais direta quanto a liberação de crédito para o desenvolvimento das atividades produtivas.

Essa lógica é clara: quando a atividade gera retorno financeiro positivo, o produtor tende a investir mais em produtividade, reinvestindo os ganhos na própria propriedade e não na expansão da área.

Scot Consultoria: O rebanho bovino brasileiro vem crescendo em ritmo mais acelerado do que a expansão das áreas de pastagens. Quais fatores explicam essa dinâmica? Esse cenário tende a se manter nos próximos anos?

Pedro Gonçalves: Isso é resultado de um conjunto de fatores. A nossa história pecuária diz muito sobre isso. No início, a pecuária funcionava mais como uma espécie de poupança do que, de fato, como uma atividade voltada à produção de bovinos e, consequentemente, de carne.

Com a mudança econômica do país, a partir da década de 1990 e início dos anos 2000, um salto foi necessário. Para não perder o dinheiro investido, quem realmente estava comprometido com a atividade passou a enxergar a necessidade de produzir mais e melhor na mesma área. Com isso, investiu em genética, manejo, produção em si.

A evolução foi grande, e teve um impacto ainda maior nos últimos 10 anos. A exigência dos mercados externos e, também do mercado interno, fez com que a pecuária atingisse um ponto ótimo de maturidade, que fez com que o peso médio dos bovinos abatidos aumentasse cerca de 1,0@ a cada cinco anos.

E isso tem relação total com a questão de expansão da fronteira agrícola. Quando se investe no seu negócio, aumenta a produtividade e o intervalo de necessidade de abrir áreas para produzir mais aumenta. De acordo com os dados do Confina Brasil e do IBGE, entre 1997 e 2025, a produção de carne por hectare cresceu em 177,2%, enquanto a área de pastagem aumentou aproximadamente 5,4%, segundo dados do LAPIG.

Scot Consultoria: Diante da volatilidade no mercado internacional de fertilizantes – especialmente em função de conflitos geopolíticos como a guerra na Ucrânia – quais são os impactos diretos sobre a produtividade das pastagens e os custos da intensificação no Brasil?

Pedro Gonçalves: Quando temos qualquer custo de produção impactando o sistema, nós observamos justamente a desintensificação da atividade. Nesse momento, estamos falando das margens.

Quando o produtor já está com o planejamento pronto, com o custo médio para produção já pré-estabelecido, e algum fator relevante de mercado acontece, começamos a ter um mercado mais emocional – tanto para cima ou para baixo. No caso da bovinocultura de corte, quando o preço da arroba sobe, muitos produtores saem do planejamento para segurar as boiadas, esperando acertar os picos de preços – ou, como se diz no campo, "acertar o olho da mosca". Já em momentos de baixa, o movimento é o oposto: as vendas são antecipadas, motivadas pelo receio de novas quedas nos preços.

Situação semelhante ocorre quando os custos de produção aumentam repentinamente. Atualmente, estamos vivenciando, por exemplo, os efeitos da guerra entre a Rússia e Ucrânia, sem perspectiva de trégua, além da competição por fosfatos, da alta demanda externa por nitrogenados como a ureia, entre outros fatores que pressionam os preços dos fertilizantes. Agora, inclusive, há a possibilidade de novas sanções à Rússia, o que pode adicionar mais instabilidade ao mercado.

Quando o produtor, que estava em uma boa perspectiva de venda, vê sua margem sendo comprimidas, o investimento realizado passa a ser percebido como um custo. Não que investimento seja, de fato, custo – mas quando se investe e não se consegue utilizar ou obter retorno, esse investimento perde sua função estratégica. Com margens já tradicionalmente apertadas, esse cenário compromete os investimentos futuros. Os passos seguintes do produtor passam a ser apenas para cobrir os anteriores, que não trouxeram o retorno esperado.

No caso das pastagens, o lado positivo é que, se o manejo for adequado, o fertilizante aplicado ainda poderá garantir a produtividade nos próximos ciclos.

Scot Consultoria: O Encontro de Intensificação de Pastagens está se aproximando. O que o público pode esperar da sua palestra durante o evento?

Pedro Gonçalves: Acredito que eles podem esperar um olhar mais voltado para a importância do sistema de pastagens no nosso país. A produção de carne bovina no Brasil é baseada em pasto – e assim deve continuar...

É o pasto quem consegue aguentar desaforos. Ele se mantém produtivo por mais tempo, sem elevar intensamente os custos de produção. E é justamente ele que garante, ano após ano, a nossa capacidade de produzir, o que tem nos consolidados como protagonistas na produção mundial de carne bovina e como importantes fornecedores internacionais dessa commodity.