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Produção de proteína animal: perspectivas e desafios

por Antonio Gilberto Bertechini
Terça-Feira, 01 de Dezembro de 2020 - 18h00


Nosso convidado dessa semana é Antonio Gilberto Bertechini. Antonio possui graduação, mestrado e doutorado em Zootecnia, é membro de conselhos editoriais e revisor de várias revistas científicas no Brasil e exterior. É autor dos livros Nutrição de Monogástricos (2013) e Fisiologia da Digestão de Aves e Suínos (2009), e de capítulos de três outros livros (dois no Brasil e um na Holanda) ligados a nutrição e produção animal.



Atualmente é professor titular da Universidade Federal de Lavras e pesquisador do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Tem experiência na área de ciência animal, com ênfase em exigências nutricionais, atuando principalmente nas áreas de digestibilidade dos nutrientes e energia metabolizável, calorimetria animal, metabolismo das vitaminas e minerais, utilização de enzimas e outros aditivos melhoradores da eficiência das dietas  para aves e suínos, nutrição de precisão e qualidade de produtos animais.



Scot Consultoria: Na sua opinião em que nível está o setor de avicultura brasileiro comparado à última década e, principalmente, em relação ao mercado internacional?



Antonio Bertechini: A avicultura industrial brasileira está alicerçada em alta tecnologia de produção que tem mantido o crescimento sustentável dos segmentos da avicultura de corte e de postura comercial. Nos últimos 10 anos a produção de carne de frangos de corte teve incremento de 28,0%, passando de 10,69 milhões de toneladas em 2010 para 13,7 milhões, na previsão para o fechamento de 2020.



As exportações estão firmes e com novos mercados compradores, devido à falta do produto e redução da produção de concorrentes. As exportações cresceram 23,5% na última década, com a previsão de crescimento para o fim de 2020, passando de 3,27 milhões de toneladas para 4,04 milhões este ano. Esse crescimento se deve ao aumento constante do consumo interno, bem como à abertura de novos mercados internacionais.



Existe tendência de aumento de compradores da carne de frangos de corte do Brasil, haja vista problemas de produção em outros países produtores e aumento das plantas certificadas para exportação. No caso das poedeiras comerciais, houve grande incremento da produção e consumo interno nesta última década.



O consumidor brasileiro passou seu consumo médio anual de 148 ovos por ano, para uma projeção alicerçada no número de poedeiras alojadas, para 250 ovos per capita passando de 2,45 bilhões em 2010 para 53 bilhões de ovos em 2020, correspondendo a 216% de incremento. Esse fato reflete o aumento significativo no consumo de ovos internamente, com maior percepção do consumidor moderno na qualidade que esse produto tem, do ponto de vista nutricional. As exportações de ovos ainda são incipientes, porém existem demandas que estão sendo consultadas para o incremento dessas exportações.



Na verdade, existe também um ponto de estrangulamento para essa exportação devido à quantidade limitada de containers preparados para o transporte. Existe perspectiva de solução do problema  para até 2021.



Scot Consultoria: A demanda por proteína animal é crescente e a disponibilidade de recursos é limitada. Quais estratégias têm sido viáveis para garantir a produção de forma sustentável?



Antonio Bertechini: Na verdade existe o incremento de tecnologia no campo, com melhoras importantes na produção de grãos. Esse aumento de produtividade tem sustentado os incrementos de produção de proteína animal, porém, a falta de uma política de controle de estoques do governo federal tem gerado muita variação nos preços das matérias-primas e influindo de forma significativa nos custos de produção.



Não existe a possibilidade de desabastecimento devido ao incremento da produção de proteína animal, já que os avanços tecnológicos na produção de carne e ovos também são acompanhados pelos avanços no setor agrícola. Cada vez mais são utilizadas menores áreas para cultivo, com maiores produções.



Scot Consultoria: A agricultura de precisão tem se destacado como uma forma de intensificar as atividades agrícolas na última década. O senhor acredita que ferramentas de precisão já são amplamente utilizadas nas cadeias de produção de proteína animal?



Antonio Bertechini: Sim, existe a aplicação na prática por muitas empresas. As ferramentas de precisão auxiliam nos processos de tomada de decisões da indústria de carne e ovos.



Atualmente, várias startups têm investido em equipamentos de precisão para auxiliar na produção de carne de frangos e ovos de poedeiras comerciais. Recentemente a Embrapa Suínos e Aves, na Inovave, selecionou várias startups com projetos interessantes e que em breve estarão sendo utilizados. 



Scot Consultoria: Quais os pontos fortes e os gargalos do setor hoje?



Antonio Bertechini: Como ponto forte, podemos citar a organização dos setores de proteína animal brasileira. Existe o domínio de todos os segmentos que alimentam cada setor, seja de frangos de corte, poedeiras comerciais, suínos, bovinos de corte e leite. Os setores estão em contínuo desenvolvimento, atendendo todas as normas e exigências internacionais para a produção. Assim, facilita muito o controle do consumo interno e da exportação.



Como gargalo, existe a falta de uma política governamental que controle a variação dos preços da comoditties dentro do país. Isso poderia reduzir as incertezas que cada setor carrega, para a manutenção de seus negócios.



Scot Consultoria: Hoje sabemos da importância do bem-estar animal em nível mundial, o senhor poderia comentar o que mudou na criação das aves? Quais os principais desafios que o avicultor tem enfrentado?



Antonio Bertechini: A avicultura segue as normas internacionais de criação e abate das aves. Existe a preocupação com as densidades de lotação dos frangos e das galinhas nas gaiolas. Esses setores têm investido em novas tecnologias que melhoram o bem-estar dos animais nas criações.



O investimento alto em ambiência é um fato e tem sido adotado nos novos empreendimentos. Aves com mais conforto produzem mais e com melhor qualidade de produto. Os setores já mediram esses benefícios e têm incrementado os investimentos no conforto das aves.



Scot Consultoria: Comparando os sistemas de produção da bovinocultura de corte à produção de monogástricos, o que o senhor acredita que cada segmento tem a aprender com o desenvolvimento do outro?



Antonio Bertechini: O segmento de frangos de corte é o mais desenvolvido no agronegócio brasileiro. O segmento de bovinos de corte deve se espelhar na organização do setor de produção de carnes de frangos de corte.



Apesar dos sistemas, em sua essência, serem muito diferentes, a partir do abate do bovino deve haver um direcionamento melhor para imprimir os diferenciais de qualidade de partes da carcaça, para poder incrementar o valor agregado desse segmento.