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Scot Consultoria

A diferença entre um problema e um problemão


Segunda-feira, 21 de janeiro de 2008 - 12h52

A FAO (órgão das Nações Unidas para questões de agricultura e alimentação) estima que, entre 2007 e 2016, a população mundial irá crescer, em média, 1,08% ao ano. Para quem acha que é pouco, isso significa mais 650 milhões de habitantes em 10 anos. Ao mesmo tempo, a renda deve melhorar, já que o PIB mundial tende a crescer, pelo menos, algo em torno de 3,5% ao ano. Isso significa que haverá mais bocas para alimentar. Além disso, elas terão maior poder de compra, ou seja, poderão consumir mais, em termos per capita. Será preciso, portanto, produzir muito mais. Tal conjuntura - aliada a problemas de ordem climática e sanitária que acometem importantes produtores, e ao direcionamento de parte da produção de grãos para a geração de biocombustíveis - levou a um descompasso entre a oferta e a demanda por alimentos, favorecendo o aumento de preços. Com relação à carne bovina, a FAO estima que o consumo mundial irá crescer 14,6% entre 2007 e 2016, alcançando 75,83 milhões de toneladas equivalente carcaça. Destaque para os países em desenvolvimento, como pode ser observado na tabela 1. A tendência, portanto, é que o mercado de carne bovina, em nível mundial, se mantenha comprador. Os preços talvez não registrem aumentos tão significativos quanto nos últimos anos, mas devem se manter firmes. A QUESTÃO DA UE Fica evidente que o cenário atual favorece os vendedores, e não os compradores. Ainda assim, a União Européia (UE), um dos maiores importadores de carne bovina do mundo, com um déficit anual de cerca de 600 mil toneladas equivalente carcaça, levantou mais uma penca de restrições à compra de carne brasileira, mediante completa ausência de justificativas técnicas plausíveis. Vale destacar que o Brasil é o maior fornecedor da UE. Na condição de consumidores, os europeus podem exigir o que bem entendem. Ninguém pode lhes tirar esse direito. O problema é encontrar fornecedores que consigam e/ou que estejam dispostos a satisfazer tamanhas exigências. Esqueçamos, num primeiro momento, a questão qualitativa. O foco agora é, simplesmente, volume. A verdade nua e crua é que a necessidade de carne bovina por parte da União Européia é enorme e nenhum outro player (participante), a não ser o Brasil, pode atendê-la a contento. Veja na tabela 2. Agora, pensando apenas em qualidade (notadamente qualidade de processos), mesmo deixando o volume completamente de lado, as opções de fornecimento também são poucas. Os exportadores disponíveis já atendem mercados que remuneram melhor do que a UE. O Japão, por exemplo, paga em média US$6 mil pela tonelada de carne bovina importada, que vem principalmente da Austrália. O Brasil exportava carne para a UE por US$4 mil, em média. Os europeus podem até “quebrar um galho” importando carne mais cara, um pouco aqui e um pouco ali. Sabe-se que podem vir a comprar dos EUA, desde que os fornecedores locais obedeçam a protocolos produtivos que proíbam o uso de hormônios. É possível até que ocorra certo estímulo à produção local, apesar da tendência de queda de subsídios. Mas 600 mil toneladas é realmente muita coisa... é um trabalho para o Brasil, e ponto final! E AGORA? Os preços da carne bovina na Europa, como na maior parte do planeta, já estavam em alta. Mediante o anúncio de novas restrições ao produto brasileiro, o movimento se intensificou. Veja na figura 1. Até 2007 a UE se destacava como o maior comprador de carne bovina brasileira, responsável por aproximadamente 33% a 35% do faturamento, considerando carne in natura e industrializada. A retração das vendas, junto a um cliente desse calibre, de forma alguma pode ser recebida com festa. Porém, se fosse para escolher um momento para que isso acontecesse, teria que ser esse mesmo. A produção brasileira está em retração, ou seja, não há excedentes. Além do mais, o País já atende mais de 180 mercados, todos (com exceção da UE) comprando cada vez mais, sendo que já tem cliente novo, como a China, pintando aí. Fora isso, o mercado interno também está em expansão, no embalo do aumento do emprego e da melhoria de renda da população. Em síntese, com ou sem embargo, a produção nacional acaba sendo escoada. Já a União Européia enfrenta sérias dificuldades de abastecimento. Somente os parcos e ineficientes pecuaristas europeus é que têm se beneficiado da bagunça que ajudaram a criar. Os consumidores locais não devem estar nada satisfeitos. Veja a tradução de um trecho da mais recente análise de mercado do Farmers Journal, da Irlanda. O colunista é o Sr. Justin McCarthy: “Em mais de dois anos escrevendo essa coluna, nunca antes havia verificado tal situação de mercado. As indústrias anunciam 3,14 euros/kg de boi gordo, mas na verdade existem preços diferenciados, que podem alcançar 0,10 a 0,15 euros/kg a mais. O fato é que os frigoríficos estão sedentos por bovinos, com prazos de fornecimento apertados. E continua a haver uma forte procura por carne.” Agora um comentário do nosso amigo Fernando Sampaio, da Zandbergen, uma das maiores tradings de carne na Europa: “Realmente os preços estão disparando por aqui. Tanto os da carne importada como o da carne européia. O problema é que vamos chegar num nível onde o consumo começa a diminuir. Os consumidores vão procurar alternativas mais baratas. No longo prazo, os irlandeses podem estar dando um tiro no próprio pé.” Nossa opinião? Para os exportadores brasileiros de carne bovina, o aumento das restrições de compra, por parte da União Européia, é realmente um problema. Porém, para os europeus, é um “problemão”. Pior pra eles.
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