• Sexta-feira, 29 de março de 2024
  • Receba nossos relatórios diários e gratuitos
Scot Consultoria

A pressão é na ponta vendedora


Quarta-feira, 23 de julho de 2008 - 17h59

O rebanho está em retração. Há menos gado disponível para abate este ano, na comparação com 2007. E o movimento de retenção de matrizes está ganhando força, graças a uma arroba de bezerro que, em algumas praças, ultrapassou a casa dos R$110,00. Tudo isso é fato consumado. Produzimos diversas análises, disponíveis em nossos informativos e em nosso site (www.scotconsultoria.com.br), com números, tabelas e gráficos ilustrando esses movimentos todos. Então... por que diabos o mercado do boi gordo afrouxou? Houve, realmente, um ligeiro aumento de oferta ao longo das últimas semanas. Independentemente da fase em que se encontra o ciclo pecuário, o mercado está sujeito a momentos de expansão e retração de oferta. No caso, podemos creditar o avanço das escalas de abate à saída dos últimos animais terminados em pastejo (instigada pelo frio e pela seca), da chegada dos primeiros lotes de confinamento e do abate de parte do gado dos próprios frigoríficos. Até aí, tudo normal. Mas vale lembrar que as indústrias estão trabalhando bem abaixo da capacidade de abate. Tem grupo grande que está, em média, com 50% de capacidade ociosa. A nosso ver, a pressão maior sobre a arroba não vem da ponta de compra (oferta de gado). Vem da ponta de venda (escoamento da carne). Acompanhe, na figura 1, a variação do preço médio do traseiro bovino no varejo paulista, ao longo dos últimos meses. Esse cálculo é feito com base no preço e na participação de cada um dos cortes na composição do traseiro. A carne subiu algo em torno de 24% para o consumidor final. O problema é que tudo subiu, não só a carne bovina. O boletim Focus, do Banco Central, aponta que a inflação desse ano tende a superar o teto da meta do governo, que é de 6,5%. Por conta do aumento generalizado dos preços, o poder de compra do consumidor caiu, como ilustra a figura 2. Está certo que continua acima da média do período analisado, mas o recuo foi significativo. E aí o carrinho do supermercado começa a ficar menos cheio. No caso das carnes, apesar de não haver estatísticas para mensurar esse fenômeno com exatidão, parte dos consumidores migra da proteína vermelha para a branca. Mesmo porque, no último ano, a carne bovina subiu mais que a de frango, como ilustra a figura 3. No que diz respeito às exportações, o cenário também não é muito animador. No primeiro semestre deste ano o Brasil exportou 963,34 mil toneladas de carne bovina, uma retração de 19% em relação ao mesmo período de 2007, como ilustra a figura 4. Como o ajuste observado para os embarques tem sido muito maior do que se espera que aconteça com os abates, e o consumo doméstico não está lá muito aquecido este ano, não se pode creditar a queda das exportações apenas à redução da produção de carne. Os frigoríficos têm direcionado, propositadamente, uma maior parte da produção para o mercado doméstico, em função (entre outras coisas) do câmbio abaixo de R$1,60 por US$1,00 e ao embargo europeu. Em síntese, o incremento da inflação e o aumento mais comedido registrado para os preços da carne de frango parecem estar levando, internamente, a um achatamento do consumo de carne bovina. Esse fator, aliado ao arrefecimento do desempenho das exportações, fez com que começasse a sobrar carne no mercado nacional, mesmo com a oferta relativamente reduzida de animais terminados. E aí as cotações despencaram. Acompanhe agora, na figura 5, o comportamento dos preços da carne bovina (carcaça com osso) no atacado desde 17 de junho de 2008, quando foi registrado o pico do ano. No último ano tem-se um forte aumento dos preços da carne bovina (figuras 1 e 3). Mas nas últimas semanas o mercado desabou. A carne de frango, por sua vez, mediante aquecimento do consumo, se valorizou. É possível, portanto, que o consumidor volte para a carne vermelha, mas isso irá depender do ritmo de repasse dos preços do varejo, do tempo em que a diferença de preços permanecerá atrativa, das notícias que forem vinculadas na mídia, etc. Há quem diga que, com a carne de frango também em alta, o consumidor agora vai atrás de sardinha, ovo, até reduzir o consumo total de proteínas de origem animal. Se bem que, nos últimos dias, até o frango cedeu. Vamos acompanhar o desenrolar dessa história. O problema para o frigorífico é que não só a carne está em queda. O couro e o sebo, outras importantes fontes de renda para a indústria, também trabalham em ambiente frouxo. Veja a figura 6. No caso do couro, tem-se o efeito nefasto do câmbio ladeira abaixo e da crise econômica dos Estados Unidos, sendo que mais de 80% da produção nacional é exportada. Com relação ao sebo, a pressão vem das indústrias de higiene e limpeza, que também apontam dificuldades de venda e de repasse de preços para o varejo. No fechamento desta análise, o frigorífico pagava R$90,00/@ pelo boi de São Paulo, mas vendia a carcaça a R$72,75/@. Colocando mais o couro e o sebo (Equivalente Scot), tem-se uma renda de R$77,59/@, ou seja, 14% abaixo do valor da matéria-prima (boi gordo). É óbvio que existe um fator estrutural regendo o comportamento do mercado do boi gordo ao longo dos últimos dois anos, que é, justamente, a redução da oferta de animais disponíveis para abate, em função da contenção de investimentos e, hoje (graças à valorização do bezerro), da retenção de matrizes. Ele continuará atuando. Atenção especial deve ser dada, de agora em diante, ao confinamento, com custos acima de R$105,00/@ engordada e mercado futuro invertido (contratos de longo prazo abaixo dos de curto prazo). O pecuarista tem que ser realmente muito “peitudo” para topar a segunda rodada, caso tenha como escoar no mercado o gado magro e eventuais alimentos já adquiridos. E o bezerro na casa de R$100,00/@ a R$120,00/@? Mediante os atuais patamares de custo e de reposição, a arroba do boi gordo está deslocada no tempo e no espaço. O mercado, portanto, deve voltar a trabalhar em ambiente firme. Do contrário, é melhor largar mão da engorda. O azar é que a fase de alta do ciclo pecuário atual inicia seu terceiro ano com sérios problemas na ponta vendedora: dólar frouxo, queda das exportações e volta da inflação em nível mundial, castigando o poder de compra dos consumidores. A venda atuava, há alguns anos, a favor da fase de alta do ciclo, graças ao forte crescimento da economia mundial (que promoveu aquecimento do consumo de carnes) e à expansão das grandes indústrias frigoríficas. Agora, atua em sentido contrário. Essa é a grande barreira a valorizações significativas da arroba, como registradas entre meados de 2006 e 2008, de agora em diante.
<< Notícia Anterior Próxima Notícia >>
Buscar

Newsletter diária

Receba nossos relatórios diários e gratuitos


Loja